Somos uma geração privilegiada. Presenciamos uma verdadeira
revolução nos hábitos sociais, econômicos e políticos e com cobertura
jornalística praticamente em tempo real. Foi assim do lançamento das bombas
atômicas sobre o Japão, via rádio, passando pela queda das Torres Gêmeas nas
telas dos televisores de nossas casas até as recentes manifestações que tomaram
conta das ruas brasileiras e também de nossas redes digitais. O torvelinho de
informações em tempo real, com plataformas multimídias, tornou-se cada vez mais parte do cotidiano. O
tempo que havia entre o fato e seu conhecimento público é hoje inexistente, o
que torna crítica a tarefa de contextualizá-lo e interpretá-lo. Perde-se o
fôlego com a avalanche de informação. A crise da indústria da comunicação não é
somente uma circunstância de “mismanagement”. Surge um novo mundo, com seus
novos desafios. Neste contexto surgem novidades confusas e polêmicas como, por
exemplo, a Mídia Ninja, no Brasil, e as experiências mais sofisticadas do
Atavist e da Vice, nos USA, todas de difícil compreensão. Fugir dos parâmetros
correntes para buscar o novo, definitivamente não é novidade. Muito menos na
área da comunicação social. A luta por uma nova ordem da informação é antiga e
tem seus protagonistas gloriosos. No mundo das redes parece fora de propósito
falar de hierarquia da informação e das fontes, mas nem sempre foi assim, recém
estamos inaugurando esta época. Tive a oportunidade de vivenciar uma dessas experiências.
Engenheiro eletricista, trabalhei na área de tecnologia da informação do setor
elétrico e militei nas lutas por uma sociedade democrática, pela instalação da
Nova República e pela convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. No
início dos anos 90, aceitei o convite para fazer parte de uma organização não
governamental, a Inter Press Service - IPS, com sede em Roma. A IPS é uma
cooperativa formada por jornalistas de todos os continentes, que tem por
objetivo dar voz para os que não a tem, ao atuar como um canal de comunicação
que privilegia as opiniões e as preocupações dos mais pobres e busca criar um
clima propício para incluí-los no processo de desenvolvimento global. Em maio
de 1991, assumi a Direção de Projetos da IPS com o objetivo de ajudar a
levantar recursos para a agência. Os projetos de comunicação da IPS são
elaborados como uma maneira de aprofundar o trabalho sobre temas específicos,
por meio da captação de recursos adicionais por parte dos doadores. A agência,
principalmente por meio de seu fundador, o jornalista italiano Roberto Sávio,
tem enorme rede de relacionamentos. Contando com esta rede, a agência construiu
uma história de concepção, execução e elaboração de projetos de comunicação em
praticamente todo o mundo. Essas atividades foram financiadas pela Comissão
Europeia, pelas agências das Nações Unidas, pelas agências nacionais de
cooperação de vários países desenvolvidos, bem como apoiadas por fundações,
organizações da sociedade civil e instituições internacionais. Um projeto de
comunicação da IPS é desenvolvido em colaboração com os seus parceiros em todas
as suas fases, envolvendo as partes interessadas da mídia, da sociedade civil e
comunidades de financiadores. O tema e o escopo dos projetos devem estar
alinhados com a linha e as prioridades da IPS e são decididos em um processo de
diálogo com os parceiros e patrocinadores financeiros. Algumas vezes, essas
questões encontraram resistências no grupo de jornalistas, mas a independência
editorial do serviço de notícias sempre foi responsável pela última palavra. Os
principais temas da agenda de projetos de IPS foram pobreza e desenvolvimento,
sociedade civil, o desenvolvimento sustentável da globalização, o diálogo entre
as civilizações e os direitos humanos e questões de gênero. Não existiu um modelo
único para um projeto da IPS, mas alguns exemplos foram extremamente relevantes
para mim. O primeiro deles foi o treinamento de jovens para aprender a ver e
relatar a sua realidade, criando assim uma rede de comunicadores nos lugares
mais complicados para a presença de jornalistas profissionais. Assim foi feita
a cobertura da retomada da vida rural em El Salvador após mais de uma década de
guerra civil. O segundo foi a discussão ampla de determinada pauta jornalística,
como os assuntos referentes às crianças. Um grupo de jornalistas, ONGs e
funcionários internacionais reuniram-se em Varsóvia para decidir a pauta de
cobertura da IPS sobre este tema por um ano. Deste projeto participou o grande
jornalista brasileiro Celso Pinto, na época correspondente da Gazeta Mercantil
em Londres. Finalmente, a agência aprendeu e especializou-se em produzir
jornais diários, em mais de um idioma, para cobrir as grandes conferências
internacionais do final do Século XX. O jornal Terra Viva nasceu no Brasil para
cobrir a UNCED 92. Fiquei 15 dias dentro da redação e das oficinas do JB, que
contratamos para imprimir o jornal. A
IPS foi criada em 1964 e até hoje segue construindo canais de comunicação entre
as pessoas. Conhecer a sua história ajuda a ter confiança na superação dos
desafios que ora se apresentam para uma indústria de comunicação social que
pretenda contribuir no esforço para o desenvolvimento humano.
(*) Artigo publicado na Edição Brasileira da Columbia Journalism Review de out/nov/dez 2013
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